Justiça Militar, escabinato e o acesso à Justiça Justa
Palavras-chave:
Acesso à Justiça, Adequação, Hermenêutica, PrécompreensãoResumo
A temática do acesso à Justiça está diretamente ligada a construção e efetividade do Estado Democrático de Direito. Todavia, as dimensões estrutural, procedimental e material do acesso à Justiça seriam destituídas de sentido se não concebêssemos a possibilidade de acesso à uma Justiça justa. É que a ampliação do sistema formal de acesso a Justiça por si só seria insuficiente e gerador de números falaciosos se o Judiciário não se estruturar de forma a produzir decisões que se adequem efetivamente às situações de vida e à visão de mundo daqueles a que elas se destinam. A especialização de conhecimentos que do Judiciário se exige não deve ser apenas do conhecimento técnico-jurídico (dito “dogmático”) ou normativo. Mas exige-se também uma aproximação visceral com o mundo existencial do qual emergem os conflitos que será a chamado a resolver. A moderna hermenêutica nos ensina que o intérprete do Direito já acessa o texto normativo munido de certas possibilidades de sentido, das pré-compreensões que, longe de revelarem um subjetivismo ou relativismo na interpretação, situam-se como verdadeiras condições de possibilidade de toda compreensão. O caso concreto reflete uma nova situação na qual o intérprete tem que renovar a efetividade da norma. Tal efetividade não se consegue simplesmente com a busca de reconstrução da intenção original do legislador, mas da mais correta apropriação das pré-compreensões envolvidas no contexto de aplicação. Considerando-se o círculo hermenêutico, o intérprete do Direito não retorna da fusão com o caso concreto ou com o texto normativo da mesma forma que nele entrou, pois seus pré-conceitos originais podem se consolidar, modificar, ou mesmo outros serem instaurados. Portanto, ante o círculo hermenêutico tem-se um melhor intérprete do Direito. E melhor intérprete, em termos gadamerianos, remete à metáfora de amplitude na qual quanto mais descrições estiverem disponíveis e quanto maior a integração entre elas, melhor a compreensão do intérprete em relação ao objeto identificado por qualquer das descrições. A prática dos julgamentos na Justiça Militar (Federal e Estadual) tem demonstrado a grande importância das pré-compreensões trazidas pelos juízes militares, advindas de sua vasta experiência na caserna. Deixar que o militar seja julgado por pares não é dar-lhe tratamento privilegiado, mas garantia de ordem, de correção e de justiça. Sobretudo se considerarmos que na estrutura do escabinato brasileiro, do julgamento também tomarão parte juízes civis, dotados de comprovada experiência e conhecimento jurídico.
Referências
ALVES, J. C. M. A Justiça Militar da União, pelo seu novo presidente. Direito Militar. Florianópolis: v. 2, n. 13, set./out. 1998. p. 3-6.
ANDRADE, C. D. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992.
AQUINO, T. Suma teológica: a fé, a esperança a caridade, a prudência. São Paulo: Loyola, 2004. v. 5, II Seção da II parte - Questões 1 - 56.
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 2. ed. Bauru: Edipro, 2007.
BERTI, E. As razões de Aristóteles. São Paulo: Loyla, 1998.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas corpus n. 103.684/DF. Relator: Ayres Britto. Brasília, acórdão de 12 de abr. 2011. Diário da Justiça, Brasília, 13 abr. 2011.
CAPPELLETTI, M.; GARTH, B. Acesso à Justiça. Porto Alegre: SAFE, 2002.
COMPARATO, F. K. A afirmação histórica dos direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 1999.
FILOCRE, L. A. Justiça Militar estadual: proposta para a Constituinte. In: POLÍCIA MILITAR DE MINAS GERAIS. Polícia Militar e Constituição: visão de estadistas, políticos, juristas e profissionais de segurança pública. Belo Horizonte: 1987. p. 83-94.
GADAMER, H. G. Verdade e Método. Tradução de Flávio Paulo Meurer. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.
__________. O Problema da Consciência Histórica. 2. ed. Organização de Pierce Fruchon. Tradução Paulo César Duque Estrada. Rio de Janeiro: FGV, 2003.
GADELHA, P. Entendendo a competência e a importância da Justiça Militar da União. Boletim Jurídico, Uberaba, n. 168, 03 mar. 2006. Disponível em: . Acesso em: 26 abr. 2013.
GONÇALVES, A. P. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 1992.
GÜNTER, K. Justificação e aplicação universalistas da norma no direito e na moral. Tradução de José Emílio Medauar Ommati. [S.l.] 2003. Mimeografado.
__________. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. São Paulo: Landy, 2004.
HABERMAS, J. Between facts and norms: contributions to a discourse theory of law and democracy. Boston: The Massachussets Institute of Technology Press, 1999.
HEIDEGGER, M. Sobre o humanismo. Tradução de Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967.
__________. Ser y tiempo. Tradução de Jorge Eduardo Rivera Cruchaga. Santiago: Editorial Universitária,1997.
PEREIRA, R. V. Hermenêutica filosófica e constitucional. Belo Horizonte, MG: Del Rey, 2001.
PERTENCE, J. P. S. Um poder independente – discurso de posse como presidente do STF. Brasília: AMB, 1995.
RIBEIRO, F. A. Conflitos no Estado Constitucional Democrático. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004.
ROCHA, M. E. G. T. A Justiça Militar da União da Constituição de 1988. Revista Âmbito Jurídico. Rio Grande: a. 14, n. 84, jan. 2011. Disponível em: . Acesso em: 27 fev. 2013.
SALGADO, J. C. A idéia de justiça em Kant. Belo Horizonte: UFMG, 1995.
SANTOS, C. R. L. Tribunal do júri e escabinato da justiça militar brasileira: duas faces da mesma moeda. Jus Navigandi. Teresina: a. 18, n. 3490, jan. 2013. Disponível em: . Acesso em: 08 abr. 2013.
SOUZA CRUZ, Á. R. Habermas e o Direito brasileiro. Rio de Janeiro: Lumens Juris, 2006.
__________. Processo Constitucional e a efetividade dos direitos fundamentais. In: SAMPAIO, J. A. L.; CRUZ, A. R. S. (Coords.). Hermenêutica e Jurisdição Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
STRECK, L. As razões pelas quais o Estado não pode se “acadelar”. Consultor Jurídico. São Paulo: 13 nov. 2012. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2012.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Copyright (c) 2023 Revista do Ministério Público Militar
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-ShareAlike 4.0 International License.
Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons – Atribuição 4.0 Internacional.